Quando eu era muito moço havia fascismo, não nos era
autorizado falar de política, e tudo o que se conseguia fazer era apreciar os
outros com base na sua honestidade e formação moral e humana. Havia gente
honesta, justa, leal, mas havia também canalhagem corrupta e mal formada: havia
"boa gente", e havia "má gente", e a luta era para que a
"boa gente" não sucumbisse à "má gente".
Depois disso a divisão entre as pessoas foi fundamentalmente
ideológica: cada um se identificava com um projeto de sociedade, e a luta era
pela implantação de modelos de sociedade diferentes, e esquecemos que havia,
como sempre houve e há de haver, "boa gente" e "má gente".
Mais recentemente as pessoas deixaram de ter um projeto de
sociedade, e entregaram-se às filiações partidárias, num espírito clânico ou
"clubista", e a luta passou a ser pelo triunfo do seu partido na
medida em que isso promovia o seu triunfo pessoal. Morreram as ideologias e os
voluntarismos altruístas, morreu de todo a ideia de se ser "boa
gente" ou "má gente", e os corruptos, oportunistas e sem
carácter, que antes eram escória, passaram a ser considerados
"espertos", ao mesmo tempo que tolerámos que ascendessem na escala
social... Não andámos bem.
Hoje temo que se tenha que voltar a encontrar na essência
humana, o ser "boa gente" ou "má gente", o primeiro nível
de apreciação dos que nos rodeiam. Antes da ideologia ou do partido, há que
"separar o trigo do joio", mesmo porque há "trigo" e há
"joio" em todas as ideologias e partidos.
Será por isso possivelmente a tarefa mais importante da
sociedade, e dentro dela dos partidos, fazer a expurga de todos os oportunistas
que se entregam à vida pública procurando benefícios pessoais, e não, como
deveria ser, benefícios para a comunidade.
Por mim, cada vez mais, aprecio o "trigo" e
desprezo o "joio". Bem vistas as coisas, o "joio" é
realmente desprezível.
Fernando R. Almeida
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