Uma mentira, se repetida mil vezes, mesmo continuando a ser
mentira, passa a ser tomada por todos como verdade. É este o caso da relação
entre os baixos salários dos portugueses e a sua baixa produtividade. Tantas
vezes se disse que os baixos salários são consequência da baixa produtividade,
que deixamos de ver que no essencial essa não é a verdade, mas antes o seu
oposto:
A verdade é que os
baixos salários promovem a manutenção da baixa produtividade.
Historicamente isso pode ser verificado e demonstrado por
muitas situações, mas dou-vos como exemplo o que se passou nos campos agrícolas
alentejanos (e não só) ao longo do século XX. Enquanto a mão-de-obra foi muito
barata, o baixo custo dos salários não justificava o investimento em máquinas.
Dito de outro modo, era economicamente mais interessante pagar o salário a um
grupo de ceifeiros, que comprar uma ceifeira. No entanto, assim que, devido ao
êxodo rural o preço do trabalho subiu, a mecanização arrancou. Acabaram os
bandos de ceifeiros e começaram a ver-se as máquinas a andar pelos campos.
O que se passou no setor do calçado em Portugal nos últimos
30 anos demonstra igualmente o que afirmo. O trabalho infantil, feito em casa, com
mão-de-obra paga miseravelmente, era justificado para assegurar a “sobrevivência”
do setor. Dizia-se que a atividade não suportava pagar sequer o salário mínimo,
e por isso o trabalho infantil era um “mal necessário”. Acabado o trabalho infantil (em boa medida
por pressão da U. E.) o setor não só sobreviveu como prosperou. Os salários
mais altos obrigam a inovar, a mecanizar, a procurar produtos e mercados
compatíveis com as novas condições de produção. Afinal era possível produzir
mais que as botas com sola de pneu de automóvel!
Compreenda-se que se um empresário tiver quem trabalhe para
si a 10 euros por mês, até pode mandar cortar um relvado com um corta unhas. A
produtividade será muito baixa, mas a 10 euros por mês… Se tiver que pagar um
salário elevado a quem corte a relva, por certo comprará uma máquina para que
se gaste pouco tempo a cortá-la. É assim a vida, é assim que efetivamente
funciona o ser humano, é também assim que funciona a economia.
Os empresários, como qualquer outra pessoa ou qualquer outro
organismo vivo, obedecem à “lei do menor esforço”: se conseguirem um rendimento
satisfatório sem ter que inovar e evoluir, manter-se-ão no conforto imobilista
da situação pré-existente; só farão o esforço de mudar, se as condições a isso
obrigarem. Mas esse esforço é afinal o combustível da competitividade e do
progresso económico, causa, mas também consequência do desenvolvimento de um
país.
Quem pensa que o desenvolvimento decorre exclusivamente do
crescimento económico numa relação de sentido único, está redondamente
enganado: o crescimento económico também pode ser impulsionado pelo
desenvolvimento.
Além de tudo isto, salários mais altos estimulam o consumo, e este é o fertilizante fundamental das empresas e da economia. Toda a gente sabe disto!
Também toda a gente sabe que trabalhadores (ou, como gostam de chamar agora, "colaboradores") bem pagos, respeitados e estimulados, são mais criativos empenhados e produtivos...
Pergunta-se então por que motivo nos mantemos neste ciclo de "baixo salário>baixa produtividade", e não evoluímos para o mundo desenvolvido do "bom salário>boa produtividade"?
Penso que talvez seja apenas porque quem nos governa representa os interesses dos maus empresários, os que ficam de "pantufas" na sua "área de conforto", os que não inovam, que preferem comprar um carro de luxo a uma máquina nova para a empresa...
Sem comentários:
Enviar um comentário